Ausência de Haddad frustra prefeitos e acirra disputa entre entidades municipalistas
Bolsonaro aparece de surpresa e ganha comício de presente

A esperada participação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), na Marcha dos Prefeitos em Defesa dos Municípios, nesta quarta-feira (21), em Brasília, se transformou em motivo de frustração. Sua ausência foi sentida especialmente no painel sobre a Reforma Tributária e o comitê gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que rateará receitas entre União, estados e municípios.
Sem Haddad, o palco foi tomado por críticas à Emenda 100, do Projeto de Lei Complementar (PLP) 108, em análise no Senado. A proposta, apresentada pelo senador Otto Alencar (PSD-BA), altera a composição do comitê gestor dos tributos compartilhados. O texto reserva 14 cadeiras à Confederação Nacional de Municípios (CNM) e 13 à Frente Nacional de Prefeitos (FNP).
A divisão gerou atrito. A CNM, entidade mais representativa e com maior número de municípios associados — em especial de pequeno porte —, considera a emenda uma tentativa de "golpe" que favorece grandes cidades, com menor representatividade, mas maior influência política. A FNP, cuja base inclui capitais e cidades médias, é ligada a lideranças como o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (MDB), defensor da proposta.
A ausência de Haddad abriu margem para especulações: por que o ministro não apareceu num dos maiores eventos municipalistas do país? Evitou um confronto com a CNM? Ou sinalizou alinhamento com Paes, que articula nos bastidores apoio à emenda? A falta de posicionamento claro aprofundou a desconfiança de que o governo federal estaria mais sensível aos interesses das grandes cidades.
Mesmo com a previsão do chamado “Seguro Receita” — um mecanismo que assegura repasses iguais por até 50 anos —, prefeitos temem que, no longo prazo, os municípios menores acabem sendo prejudicados, como já ocorreu com os royalties do petróleo. O episódio reforça uma antiga sensação: Brasília nem sempre ouve os que vivem a realidade do interior.
Bolsonaro transforma marcha em palanque político
Se a presença de Lula provocou vaias abafadas, a de Bolsonaro incendiou a plateia. De surpresa, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi levado por parlamentares do seu partido até o evento e, mesmo sem constar na programação, discursou como se estivesse em campanha.
Bolsonaro "apareceu de surpresa" na Marcha dos Prefeitos (Foto: CNM)
A cena foi conduzida por Ciro Nogueira (PP), que abriu mão de sua fala para ceder o microfone ao ex-chefe do Executivo.
“Para um ex, isso não tem preço”, disparou Bolsonaro, arrancando aplausos. No discurso, revisitou seu mandato, culpou a pandemia, guerras e a crise hídrica pelas dificuldades e retomou o bordão “mais Brasil, menos Brasília”.
Mas foi ao fim que entregou o verdadeiro propósito de sua aparição.
“Tenho saudades de servir à pátria. Não tenho obsessão pelo poder, mas paixão pelo Brasil. Se Deus quiser e me permitir, serei uma opção para o país”.
A frase, ainda que envolta em espiritualidade e patriotismo, tem endereço certo: as urnas de 2026.
Cena está prestigiado
O ex-prefeito de Pinhalzinho, Mário Afonso Woitexem (PSDB), vive um momento de prestígio nacional. Atual coordenador da Confederação Nacional de Municípios (CNM) para a Região Sul, Woitexem teve acesso à sala VIP da Marcha dos Prefeitos e foi destaque como painelista em diversas atividades — inclusive naquele que teria a aguardada participação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Cena faz parte da Confederação Nacional de Municípios (Foto: CNM)
Atualmente, Woitexem integra o conselho político da CNM e atua nos bastidores da formulação das principais pautas do municipalismo brasileiro. Com foco especial em temas como gestão fiscal e receitas públicas, tem se consolidado como uma das vozes técnicas mais influentes na articulação entre municípios e o governo federal.