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Dois pesos e duas medidas: o descaso com os produtores do Vale do Araçá

Famílias do Oeste catarinense vivem o drama do bloqueio fundiário enquanto veem o Governo Federal agir com agilidade para resolver situações semelhantes em outros estados

15/05/2025, 18:08
Atualizado há 4 dias
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Por Fabiano Rambo
Deputada Daniela Reinehr, prponente da audiência pública, com uma camisa do DPD (Foto: Divulgação)Deputada Daniela Reinehr, prponente da audiência pública, com uma camisa do DPD (Foto: Divulgação)

O agricultor do Vale do Araçá — região que abrange os municípios de Saudades e Cunha Porã, no Oeste de Santa Catarina — merece o mesmo respeito e tratamento dado aos produtores rurais do Pará. No entanto, o que se vê é um cenário de desigualdade na atuação do Governo Federal.

Ambas as regiões enfrentam disputas fundiárias envolvendo áreas reivindicadas como terras indígenas. A diferença? No Pará, o Cadastro Ambiental Rural (CAR) foi desbloqueado. Já no Vale do Araçá, os agricultores continuam impedidos de acessar políticas públicas e financiamentos essenciais para sua produção.

Na última terça-feira (13), uma audiência pública foi provocada em Brasília pela deputada federal Daniela Reinehr (PL), em busca de uma solução para a crise que assola os produtores catarinenses. Durante o evento, o vice-prefeito de Cunha Porã, Rafael Boer, o Rafão (PP), expressou sua indignação ao relatar a inércia dos órgãos responsáveis — como o Incra e a Funai — que, até o momento, se isentaram de oferecer qualquer explicação sobre o bloqueio do CAR.

No dia seguinte, o contraste ficou ainda mais evidente. O governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), publicou em suas redes sociais um vídeo agradecendo à ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT), pela atuação direta que resultou na liberação das áreas contestadas por agricultores paraenses — terrenos que, vale lembrar, foram inseridos no sistema da Funai e cuja legitimidade é também questionada no estado nortista.

Esse cenário levanta questionamentos incômodos, mas necessários: Falta influência política de Santa Catarina no Governo Federal? Os representantes do Oeste catarinense não estão batendo nas portas certas? Ou seria o caso de uma retaliação política disfarçada — dado que o estado não deu maioria de votos ao atual presidente nas eleições de 2022? São perguntas que merecem reflexão urgente, pois o futuro de centenas de famílias segue indefinido.

Vale do Araçá: 25 anos de litígio e resistência

Com 2.700 hectares de extensão, o Vale do Araçá abriga hoje 167 famílias — cerca de 408 pessoas — segundo o Movimento de Defesa da Propriedade e Dignidade (DPD), criado após a invasão indígena registrada no ano 2000. O litígio, que já dura 25 anos, iniciou quando o hoje deputado Mauro De Nadal ainda era prefeito de Cunha Porã. Desde então, ele e outras lideranças apoiam ativamente a luta dos produtores da região.

A área em disputa tem peso significativo na economia local: representa aproximadamente 10% do Produto Interno Bruto (PIB) de Cunha Porã. Os produtores do Vale abastecem o mercado com alimentos suficientes para alimentar 179 mil pessoas com carne de frango e outras 125 mil com carne suína, conforme dados do DPD.

Os agricultores contam com duas decisões judiciais favoráveis à não demarcação da área como terra indígena, nomeada de Guarani de Araçáí. O DPD também dispõe de laudos antropológicos que contestam os relatórios da Funai quanto à presença de ancestralidade indígena no local.

Mesmo assim, o caso segue indefinido nas instâncias superiores. A tese do Marco Temporal — que poderia reforçar juridicamente a causa dos produtores — ainda não avança no Supremo Tribunal Federal (STF).

Enquanto a Justiça não se posiciona de forma definitiva, o tempo corrói a esperança e as finanças de centenas de famílias. O Vale do Araçá agoniza econômica e socialmente, aguardando que o direito à terra — e ao respeito institucional — seja estendido também a quem vive e produz em solo catarinense.

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