Novo EaD promete qualidade, mas deve encarecer cursos a distância
O novo decreto moderniza o ensino a distância, porém a medida impõe mais exigências às instituições que devem repassar custos aos estudantes

O Governo Federal deu um passo importante para a reformulação do ensino superior a distância no Brasil. Em decreto assinado nesta segunda-feira (19), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao lado do ministro da Educação, Camilo Santana, instituiu as diretrizes da Nova Política de Educação a Distância (EaD). A promessa oficial é ambiciosa: mais qualidade, infraestrutura e interação pedagógica. No entanto, especialistas e gestores de instituições privadas alertam que, na prática, o aumento da exigência estrutural e a limitação de formatos poderão provocar um encarecimento generalizado dos cursos EaD.
Ao incorporar exigências como mínimo de 20% de atividades presenciais ou síncronas mediadas, laboratórios obrigatórios nos polos e a presença de mediadores pedagógicos com formação específica, o novo marco regulatório sinaliza um claro reposicionamento do ensino a distância: deixa de ser um modelo de baixo custo para se aproximar, em estrutura e cobrança, do ensino presencial ou híbrido. Isso pode comprometer justamente o seu maior trunfo: a acessibilidade econômica.
“Acreditamos que a EaD pode proporcionar ao estudante uma experiência tão rica quanto a dos demais cursos”, afirmou o ministro Camilo Santana, defendendo que a qualidade da modalidade só será atingida com compromisso institucional e investimento real.
Regras mais rígidas, estrutura mais cara
- Entre os principais pontos do decreto, destacam-se três mudanças com impacto direto nos custos operacionais:
- Exigência de polos com infraestrutura física e tecnológica robusta, incluindo laboratórios e espaços de estudo;
- Obrigatoriedade de avaliação presencial para cada unidade curricular, com peso maior na nota final;
- Criação da figura do mediador pedagógico, função diferente do tutor, com formação acadêmica compatível ao curso e atuação exclusivamente pedagógica.
Essas determinações obrigam instituições a reverem seus modelos logísticos, contratações e infraestrutura, o que inevitavelmente aumenta os custos fixos. A tendência é que esses custos sejam repassados ao valor das mensalidades, afetando o perfil socioeconômico de estudantes que até então viam na EaD uma alternativa mais acessível à educação superior.
Semipresencial: o novo caminho
O decreto também oficializa o modelo semipresencial, uma mescla entre aulas físicas e virtuais, com no mínimo 30% da carga horária em atividades presenciais e 20% síncronas mediadas. Embora represente uma tentativa de modernização, esse formato poderá aumentar ainda mais a complexidade logística — especialmente para estudantes que vivem em regiões com baixa oferta de infraestrutura educacional.
Outro ponto polêmico é a proibição da oferta EaD para cursos como medicina, direito, enfermagem, odontologia e psicologia, além de diversas licenciaturas e graduações da área da saúde. As instituições terão dois anos para se adaptar às novas exigências. Embora esse movimento busque preservar a qualidade acadêmica, ele representa uma barreira para a democratização da formação nesses campos, especialmente nas regiões onde a única alternativa viável até então era o modelo remoto.
Impacto nos estudantes e no mercado educacional
Ao mesmo tempo em que busca frear a proliferação de cursos de baixa qualidade, o novo marco também restringe a lógica de escala que sustentava o crescimento da EaD nos últimos anos. Segundo dados recentes do Censo da Educação Superior, mais de 60% das novas matrículas em graduação no país foram em cursos a distância — número que pode ser impactado com a elevação de custos e restrição de ofertas.
O modelo atual favorecia instituições de grande porte com forte capilaridade nacional. Com as novas exigências, a competição deve se reduzir, favorecendo as universidades que já contam com infraestrutura e capacidade de adaptação, e dificultando a atuação de instituições menores ou startups educacionais. Neste contexto, as menores instituições - ou com abragência mais regional - podem ser beneficiadas.
A Nova Política de EaD marca um avanço regulatório necessário, que busca valorizar o ensino, os professores e a formação pedagógica no ensino superior. No entanto, ela também impõe desafios concretos e financeiros que podem restringir o acesso à modalidade — especialmente para estudantes de baixa renda.
O futuro da EaD será menos sobre expansão desenfreada e mais sobre qualidade com sustentabilidade financeira. O desafio agora está em encontrar o ponto de equilíbrio entre excelência e acessibilidade — sob o risco de transformar uma solução de inclusão em mais uma barreira.
Abaixo uma síntese com as mudanças provocadas pelo novo decreto.
Aspecto |
Antes |
Depois |
Formato do curso |
100% remoto, com vídeos gravados e mínima exigência presencial |
Mínimo de 20% de atividades presenciais ou síncronas mediadas |
Avaliação |
Provas esporádicas, com peso variável |
Pelo menos uma prova presencial por disciplina, com peso majoritário |
Corpo docente |
Tutores acumulando funções pedagógicas e administrativas |
Criação do mediador pedagógico com formação compatível e atuação exclusiva |
Polos EaD |
Estrutura básica, com foco apenas no suporte administrativo |
Polos com laboratórios, estrutura física e tecnológica obrigatória |
Tipos de atividades |
Sem definição formal entre modalidades |
Classificação clara: presencial, síncrona, assíncrona e síncrona mediada |
Cursos proibidos em EaD |
Sem proibições claras |
Proibição para medicina, direito, enfermagem, odontologia, psicologia e licenciaturas |
Custo para o estudante |
Mensalidades acessíveis, baixo custo operacional |
Tendência de encarecimento geral pela nova estrutura exigida |