Natal, tempo de olhar para as estrelas

A data que vai muito além dos presentes

22/12/2023, 11:01
Atualizado há 12 meses
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Por Ricardo Niquetti
O natal tem várias simbologias (Foto: Divulgação)O natal tem várias simbologias (Foto: Divulgação)

Na infância, ansiamos pelo despertar e pela revelação dos presentes de Natal. Não nos importávamos com o embrulho; rasgamos os pacotes com entusiasmo, ansiosos para descobrir seu conteúdo. A dúvida persiste: o que se esconde dentro dos presentes natalinos? Será que eles guardam apenas mercadorias ou há algo mais neles? E se aplicássemos essa lógica ao próprio natal, o que ele traz internamente?

Vamos a uma cuidadosa viagem de trenó sem renas, somente com o espírito. Se pensarmos com cuidado, a simbologia da celebração natalina é familiar, obviamente que "Natal não se resume aos presentes e festividades", como afirmam os cristãos, enfatizando a comemoração do nascimento de Jesus e a reunião familiar singular em seu nome. Contudo, embora padres e pastores tenham boas intenções, é evidente que essa resposta soa, no mínimo, ingênua nos dias atuais.

É bastante claro que os valores natalinos de amor ao próximo foram usurpados pelo consumismo desenfreado, que vai de presentes a jantares sofisticados, passando por viagens e decorações pomposas, ou seja, não é surpresa que o valor moral natalino tenha sido substituído pela influência do dinheiro, do Instagram, do capital e pelo desejo consumista, e isso ultimamente não parece ofender mais, nem mesmo, as religiões.

Embora não haja um axioma cristão com o lucro, ao investigarmos as origens de muitos de seus ritos, nos deparamos com uma oportunidade valiosa para refletir sobre este período que se aproxima e reviramos um pouco seus fundamentos.

Certamente, começamos com o simples, porém notável, fato de que Jesus supostamente nos ensinou a marcar os anos. O nascimento do Filho de Deus marca o início de uma nova era para a humanidade, o ano zero.

É curioso, pois parece que renascemos com Cristo. No entanto, é difícil determinar se os fenícios, os maias ou os aborígenes concordariam com essa divisão. Não é estranho que tenhamos reiniciado a contagem? Que poderosa mudança é essa que nos levou a considerar a maior parte de nossa história como um passado ultrapassado? Vamos voltar a esse ponto mais adiante.

Para desfazer a ilusão de uma história que recomeçou do zero, basta perceber que a própria data do Natal, dia 25 de dezembro, tinha suas raízes em uma festividade pagã: a comemoração do Nascimento do Sol Invencível. Essa festa foi estabelecida pelo imperador romano Aureliano em homenagem a uma das principais divindades do império. Aliás, essa celebração substituía, por sua vez, o nascimento de Mitra, uma antiga divindade do zoroastrismo indo-iraniano.

O Papa Júlio I propôs dar um novo significado ao ritual, mantendo a mesma data. Se ele fosse um gerente de marketing, poderíamos dizer que se tratou de um rebranding. Esta não foi a única campanha bem-sucedida desse departamento; diversas festas cristãs têm conexões diretas com culturas anteriores. A Páscoa, o carnaval, as festas juninas, o Dia de Finados, o Dia de Todos os Santos são apenas alguns exemplos disso.

É intrigante que a data escolhida para o nascimento de Jesus coincida com o solstício de inverno, uma data que marca o aniversário de várias outras divindades como Osíris, Apolo, Atis, Mitra, Horus, todos celebrando seus aniversários no mesmo dia. O motivo por trás disso é relativamente simples de entender: para os seres humanos, o solstício de inverno pode ser considerado o evento astronômico mais significativo do ano. Nesse dia, o Sol, no hemisfério norte, atinge sua inclinação mínima antes de começar a subir novamente, sinalizando a chegada das estações mais quentes.

O solstício de inverno representa a noite mais longa do ano e simbolicamente marca a vitória sobre o frio, a escuridão, o medo e as dificuldades. É um momento de esperança, quando o Sol retorna para nos iluminar e abençoar com suas dádivas calorosas. Nesse sentido, os cristãos, sem necessariamente saber, celebram alguns dos cultos mais antigos do mundo.

Assim, dar um passo para trás nos leva a uma perspectiva valiosa sobre o significado do Natal: como um período para contemplar o céu, uma oportunidade de desacelerar. É um momento que, por essa desaceleração, tem o poder de reunir as pessoas sem pressa, afastadas do trabalho, permitindo-lhes desfrutar do tempo juntas. É um convite para usufruir da calma e da serenidade desse momento especial.

Mesmo que geograficamente não estejamos conectados ao solstício do hemisfério norte, o que está sendo comprometido no Natal é algo mais profundo: nossa habilidade de encarar o fim de ciclos, repensá-los, contemplar essas transições e nos preparar para novos caminhos. Poderíamos arriscar agora, que a essência do Natal resumidamente é uma oportunidade de refletir sobre mudanças, encerramentos e o surgimento de novas veredas.

Esta atmosfera é tão rara, que se observarmos as nossas festividades, rituais ou cerimônias que reúnem amigos, tempo para descanso, fortalecimento de laços e celebração pela união entre pessoas, possuem uma lógica diversa, pois é raro encontrar nessas reuniões algo que não esteja envolta em consumo e distrações. É como se a essência desses momentos se perdesse em meio a aspectos consumistas e distrações que muitas vezes desviam o foco do que realmente importa.

Exato, repensar o Natal torna-se fundamental. Ao direcionarmos nosso olhar para as estrelas, valorizando o Sol como um símbolo primordial de vitalidade e força cósmica, podemos verdadeiramente começar a compreender nossa essência. O Natal e suas festividades antecessoras, celebrando o que é imortal em nós, representam o que precisamos resgatar e ver brilhar novamente.

O Sol foi reverenciado por diversas culturas não apenas por seu fascínio matemático ou estético, mas pela oportunidade de contemplar ciclos e momentos de reflexão que, quando ameaçados, precisam ser recuperados. Não há nada mais nobre neste Natal do que reviver a magia das estrelas que ainda reside dentro 
de nós.

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